Sarah: História de Origem - Concluído

Sarah caminhou até a ponta do píer, deixando marcas na madeira mofada por onde ela passava. Havia uma mesa de pau logo ali, um homem jazia sentado num toco de madeira, ele cobrava o valor das passagens de todos os que se apresentavam. O saco de moedas é arremessado pela Mink sobre a mesa, seu olhar era vazio, e o do homem tampouco esboçava reação, era velho e não ligava para a busca sangrenta daquela mulher.

O velho lobo do mar, marcado pela luz do sol em sua pele frágil e quebradiça abriu o saco, contou as moedas e acenou com a cabeça. O Paku em seu ombro encarava Sarah com desdém. "Pica mula! Pica mula! Curupaco!" ele latia odiosamente, conforme a prancha era baixada e o caminho aberto para o deque do navio.

Sarah havia provado sua falta de habilidade na cozinha, porém, aquilo havia gerado conhecimento para quem sabe suas futuras tentativas. Entristecida ela retornou até o deque do navio, passando pelas escadarias e percebendo o movimento reduzido, alguns tripulantes apenas conversavam e interagiam entre si, descansando da manhã agitada. Sarah tinha algumas opções de lugares para se enfiar, porém, já do lado de fora ela percebeu o rapaz de mais cedo perto da proa e o capitão no castelo do mastro.

Sarah se aproximou sorrateiramente como um verdadeiro assassino pronto para atacar sua presa. Os marujos mais próximos a encaravam em seu bote, porém, sua vítima só percebeu tarde demais. O susto o fez quase saltar, olhar para trás naquela pose constrangedora e ficar vermelho. "Hein? Que isso, f-ficou doida?" ele perguntou, tentando se desvencilhar gentilmente.

Esfregando a própria nuca ele ria desconsertado. "Uhum" ele afirmou. Os marujos ao redor, eram três deles, suas idades não eram tão dispares, foram se distanciando conforme os dois conversavam. "Estávamos matando o tempo, Joe disse que estamos perto de um mar de inverno! Não é o máximo?" ele falou com os olhos brilhando, e então se aproximou da amurada da proa do navio. "Se dermos sorte, poderemos ver aquelas tais baleias arco íris, mas precisamos ficar em silêncio" ele explicou, com um tom sonhador na voz.

O rapaz ri e olha para trás, por cima do ombro, para encarar Sarah. "Aha! Pelo menos o Chef é paciente, se fosse qualquer outro ele provavelmente teria cozinhado você" depois da piada, ele apoiou os braços na amurada e olhou de novo para o horizonte. "O Joe fica na cesta, ele adora a sensação de enjoo lá de cima" ele apontou para a cesta do mastro principal. Não dava para ver direito, mas parecia haver alguém lá em cima "Provavelmente não vamos passar pela ilha, apenas pelo mar ao redor, entendeu?" explicou o garoto.

Apesar de sua conversa, Sarah também estava imersa em seus pensamentos. Ela estava caçando aqueles piratas há semanas, talvez meses. Sem poder confiar em ninguém além de seus instintos. Uma pista sobre o paradeiro deles foi o que havia a levado a pegar aquele barco. Que lugar melhor para se encontrar piratas senão em porto real? Aquela era sua única e melhor pista. "Veja, bem ali!" disse o rapaz, surpreso com alguma coisa. Em seus olhos um brilho jovial estampado o animava feito uma criança que acabará de receber um presente de natal.

Apesar de confusa havia uma singela e inocente curiosidade em volto aos pensamentos de Sarah. Ela correu até a amurada do navio e apoiou as mãos na madeira seca. Seus olhos buscavam no horizonte algo escondido, algo que ela não sabia o que era ou de onde viria, quase como uma criança buscando um premio escondido. Sarah encarou o horizonte por alguns segundos, o silêncio do rapaz sequer a preocupou, ela estava tão focada, quase cerrando os olhos que antes que pudesse ter qualquer reação ela ouviu o som de um zunido alto, porém belo, como uma canção.

O som ficou mais forte, ecoando uma segunda vez, até que um brilho emergisse no meio do oceano. A água se espalhando pelo ar conforme a silhueta de um monstro de mais de dez metros emergiu em pleno ar, jogando sua cauda para o alto. O brilho forte vindo de seu corpo era refletido por todas as gotículas de água, produzindo nuvens de arco-íris que se espalhavam até o instante em que se chocou novamente com o oceano, tingindo toda a superfície do mar com dezenas de cores e tons que emergiram junto a besta colossal.

A baleia terminava o seu mergulho, deixando para trás apenas a chuva produzida pela implosão da água que ia se dispersando pouco a pouco.

— Woah...! — a surpresa esboçada pelo rapaz delatava que ele também nunca havia presenciado uma cena como aquelas, mas, de alguma forma ele tinha conhecimento sobre aquilo.

— Sim... Eu vi! Aquilo era uma Nivalis, uma baleia dos mares de inverno. Piratas e caçadores mal intencionados vivem as matando por conta da tinta que seu corpo produz, é uma pena... — Ele se afasta da amurada e vira de costas para ela, as apoiando no muro conforme olhava para o navio.

— O mundo é um lugar enorme e maravilhoso... Eu virei marujo para poder conhecer mais dele! É incrível, não acha? — ele sorriu, acenando positivamente com a cabeça.

Sarah permanecia sorrindo, seus olhos fixos no horizonte, registrando na memória a cena impactante da baleia arco-íris. Era um momento que ela provavelmente carregaria consigo ao longo de sua vida.

Ao seu lado, o rapaz marujo expressava contentamento pela experiência de testemunhar a magnífica criatura. Ele apoia as mãos na cintura, esfregando a base do nariz com o indicador, antes de dirigir-se à sua companheira.

— Aliás, qual o seu nome, hein? — o rapaz pergunta, recordando que ainda não haviam se apresentado.

O rapaz cruza os braços e infla as bochechas com a forma debochada de Sarah. Ele caminha em sua direção e atinge um peteleco em seu nariz.

— Você nem sabe o meu pra falar isso... Meu nome é Mark! — O rapaz apontou para si próprio com o polegar e sorriu. Foi então que os dois ouviram o grito do vigia da cesta, seu berro cheio de energia anunciava o que todos ali tanto aguardavam. "Terra a vista", ele gritava.

Ainda com o braço cruzado ele balança a cabeça negativamente, conforme os gritos eram anunciados e Sarah desviava a atenção para o horizonte, encarando o oceano até finalmente encontrar a figura distante da ilha brotando no horizonte. Um pequeno pontinho que mal dava para perceber algum detalhe relevante, mas, ao menos dava para ver montanhas e vegetação, nada de neve ou picos rochosos.

— Lá está, porto real, lar dos piratas... E por falar nisso, o que você veio fazer aqui? — Perguntou Mark, curioso sobre a viagem de Sarah, afinal ela não se parecia exatamente com uma pirata.